Children of Men, 2006 – Direção: Alfonso Cuarón – Elenco:Clive Owen, Julianne Moore,Michael Caine.

Estamos diante de um Apocalipse cético, sem Deus ou Diabo, ou anjos e Demônios, ou pragas e acontecimentos fantásticos, tudo aqui é realista, é normal, não temos carros que voam nem “Robocops” ou exterminadores do futuro, temos apenas uma realidade onde o fim já é sabido e obviamente triste, onde todos morreram sem ter nem ao menos a chance de procriar e permear uma nova geração; não há mais bebês no mundo, o caos aumenta em toda parte, a pessoa mais jovem do mundo é assassinada só por não querer ser uma celebridade pelo único fato de seu nascimento ter ocorrido. O fim não está próximo, já chegou, a humanidade acabou, não nasce mais ninguém, e por tudo que é mais impressionante, o ser humano ainda odeia sua própria raça em tempos como este. Não há introdução de forma alguma há este mundo, mas há uma convivência quase que forçada por parte de nós (público) e deles (personagens) em convivermos como se fôssemos um deles e entendermos aos poucos tudo que ocorre, o que nunca é trabalho duro, pois é uma realidade tão próxima da nossa, que tudo, além de fazer sentido, é humano e inteligível a qualquer um que viva nesse novo século.

Theo é nosso centro, mas nunca herói. Kee é a fé que não existe em nenhum ser humano. Eu e você somos “mais um” em meio a tudo, e não só assistimos, mas temos um papel em tudo, o de refletir. A morte sempre nos acompanha, mas nunca de forma triste ou desesperada, mas sempre inesperada e rápida. Cuarón é o jornalista que relata tudo de forma seca, sem ficção ou diversão, só com o real e consequentemente, triste. A câmera é o veículo que nos apresenta os relatos de Cuarón e seu futuro caótico e xenofóbico. A Inglaterra é a locação onde o repórter escolhe para começar sua tese. Tudo faz parte e tudo é personagem, todos são humanos e todos têm papel, a decupagem nos mostra isso de forma inconsciente, mas o faz de forma clara também. As informações não passam de um jornal do dia seguinte, não tem introduções e provavelmente tem fins, mas também vêm carregados de um caminho interminável de desgraça e que toda manhã, ao abrir o tal jornal as coisas podem ainda não ter terminado. E no meio do fim incerto Theo resolve seguir os preceitos mais comuns ou inocentes do que é certo e errado e protege Kee das mãos de rebeldes enfurecidos em busca de um troféu ou chave para a vitória de uma guerra sem “porque” e que provavelmente não tem fim.

E em busca do “Amanhã”, todos que tem o mínimo de fé ou vontade de fim para toda uma guerra estendem uma mão a Theo e Kee, um que é tão herói quanto eu ou você, e a outra que é tão jovem e inocente quanto as próprias crianças inexistentes ali. Muitas mortes passam no caminho e nada parece ajudar nenhum dos dois a ter fé, mas tudo o que perseguem pode também ser visto como um “conto do Vigário” ou até “contrabando de órgãos”, mas o Amanhã é muito mais importante que o hoje ali, e em busca dele, ambos competem consigo mesmos e batalham diante de uma parede que sempre esbarra com eles e os impede de dar o próximo passo rumo a algo que sobrepõe a dúvida acima de todos, por nunca se apresentar, por nunca se manifestar em meio a guerra ou aos homens, mas de sempre manter a esperança e porque não a própria dúvida? O Amanhã é um religião ali para todos, ou um “Deus” que os transforma em corredores de um desconhecido mas que no fim de tudo é uma “causa”, a causa pra se viver, um motivo pra sentir algo, pois ninguém sente mais nada, afinal a felicidade já é passado, o “sentir” é algo raro e correr em busca de “Deus” torna tudo pelo menos objetivo, mesmo sendo algo do mais alto escalão da subjetividade. E quanto mais “Deuses” aparecem, mas as pessoas sobrevivem por um dia bônus. Pois até estojos suicidadas são vendidos para qualquer um que queira desistir de buscar “Deuses” em toda parte, como em um menino que é o mais novo do planeta ou em um navio que pode resgatar uma grávida e mantê-la segura e porque não estudá-la e curar todas as outras mulheres?

Kee é mais que uma Deusa, mas também um talismã e uma bandeira, enquanto carrega o bebê dentro de si ela é um objeto útil, a partir que a criança se separar dela, ela continua sendo um objeto, só que sem utilidade alguma. E Theo é o único que a vê como ser humano e por isso a protege como filha, sem importar com a importância do bebê em muitos momentos, o que mais o preocupa é sempre o agora, o que claramente nos remete há um ceticismo nu por sua parte em não crer no amanhã e mesmo assim, levar a garota em busca deste. E em meio a uma revolução com uma câmera quase sem cortes e planos-sequência inesquecíveis, os revoltados morrem e matam soldados do nada ou “de nada”. Mas tudo para, quando um choro, um único choro universal, sem língua específica ou naturalidade, apenas sonoro e universal para tudo, todos e faz do silêncio o berço da criança a que todos veneram e se impressionam ao ver, e por mais indireto ou não proposital, a criança se torna um manto branco de paz e cessar fogo, onde todos entendem e compreendem o quão importante uma vida nova realmente vale, e esquecem a matança exacerbada e forçada que ocorre ali, mas não por muito tempo, pois um míssel quebra o feixe de paz e nos remete a violência incansável e eterna onde a paz falta, mas sempre existe. E o último brilho fica por conta das pessoas que sempre têm fé, mesmo que não em Deus ou em Santos, mas fé nelas mesmas ou em seus companheiros, pois além de convivermos todos os dias conseguimos ser mal educados e grosseiros com pessoas que se importam com agente. E ninguém reflete sobre o caos que seria não termos bebês, e nunca pensam no fim de tudo sem glamour ou poesia, nada de história bíblicas com cenas fantásticas de anjos contra demônios, mas apenas a humanidade terminando com ela mesma e nada mais. Mas o relator Cuarón termina sua tese e nos encaminha em seus créditos finais a vozes de crianças brincando, sorrindo, se divertindo e faz sim chorar, pois depois do mundo tortuoso e cinza que nos mostrou sem nem um pouco de imaginação, apenas com o real, ouvir o que causou o fim faz qualquer um pensar e porquê não agir de forma nova e eficiente, e é claro, após o mundo desgracento visto, viver um pouco faz bem a a qualquer um.

5/5

de Igor Frederico

Máscara Mortal

05/03/2010

The Masque of the Red Death, 1964 – Direção: Roger Corman – Elenco: Vicent Price, Hazel Court, Jane Asher.

Corman, juntamente com o mítico ator Vicent Price, foram responsáveis por traduções (acredito que esse termo defina melhor esse filme) da obra de E. Alan Poe. Sombrio, estilizado, horripilante, ao mesmo tempo que com diálogos afiadíssimos e de um poder argumentativo genial, The Masque of the Red Death consegue transmitir muito daquilo presente no conto de Poe junto com a capacidade inventiva de um mestre do horror, cujo herdeiro maior de seu estilo atualmente, é, evidentemente, Tim Burton.

O filme conta a história do prícepe Própero. A história, parece se passar na Itália medieval, donde os signos dessa época são discutidos com o talento apurado do diretor Corman. Próspero é um príncepe tirano e bizarro, que aterroriza uma aldeia. Lá, ele rapta a jovem Francesca, sequestrando também, o pai da moça e o namorado desta. Em seu castelo, Próspero refugia-se da peste conhecida por Morte Rubra, que rogara uma praga pela região. Junto de alguns nobres da região, o príncepe promove festas. Seus prisioneiros, todavia, nem imaginam o que iriam encontrar naquele misterioso castelo.

À trama macabra, junta-se toda uma rede de signos horripilantes orquestrados pelo esteticismo grandiloquente de Corman. Cada cenário extravagante, cada enquadramento efetuado pelo diretor, serve sobremaneira para criar uma atmosfera sombria e um suspense visceral em torno de como vai agir a Morte Rubra, e de o que esconde aquele castelo excêntrico e assustador.

Nisso tudo, vale destacar a Fotografia de Nicolas Roeg, sobretudo nas cenas que se passam na floresta da aldeia. Interessante como Roeg, constrói o ambiente perfeito diante de um signo medieval tão instigante como é a floresta. Lá está o mal. Os que por ali passam encontram a morte e são por essa iludidos. Sem dúvidas, tal ambiente gótico se compõe com impressionante fascínio graças a precisão cirúrgica dos closes de Corman, e da fotografia soturna de Roeg.

Dentro do castelo de Próspero, os vários salões são decorados com uma apuro de detalhes impressionante. Interessante é ver como Corman procurou sempre filmar Próspero rodeado de pessoas, nunca só. Por outro lado, o clima de suspense se instaura quando Francesa (Jane Asher) busca desbravar algumas salas daquele castelo, só. Genial o plano-sequência. Corman focaliza as expressões da jovem e pura menina e mostra todo o seu medo diante do desconhecido.  Mais além, nessa cena, o diretor talvez explore um dos mais brilhantes conceitos sobre o medievo: o de coletividade e segurança. Francesca está só, longe de sua família, longe de sua religião ( ela, no caso, está sendo tentada por Próspero que fizera um pacto com o demônio), sendo assim, está sujeita a ser atacada por forças malígnas.

O final, é algo que o cinema realmente merecia. Vale o filme todo, como se não bastasse já a sequência inicial. Há a dança da morte no castelo de próspero, há também o final macabro com a marcha das mortes, cada uma em um cor específica, acompanhadas de uma citação de Poe.

Não apenas por ter Price em um papel quase mítico, como Próspero, mas pelo talento de Corman,  Roeg, e a estilizada direção artística, The Masque of the Red Death é uma obra prima do terror gótico. Um filme excencial, de um diretor pouco conhecido, mas de um talento e domínio da linguagem cinematográfica enormes.

4,5/5

Por: Allan Kardec